26 junho, 2016

Interdependência

Um ensaio sobre dependência, independência e interdependência/autonomia.

por Milene Siqueira



Nossos maiores desafios estão na fase da DEPENDÊNCIA. Principalmente quando somos crianças e ainda não temos NENHUMA condição de lidar com os fatos e faltas (e tão pouco há apoios aptos ao nosso redor), é quando fere o nosso ego profundamente. Tudo aprendizado, construção para a independência e para o “bem” do próprio ego, que está aprendendo sobre se defender.

E aí nas duras lições, aos trancos e barrancos ganhamos INDEPENDÊNCIA, e tipo gato escaldado vamos sacando as coisas. Como não temos nenhum domínio ainda, nos protegemos demais, blindamos as couraças formadas. E geralmente agimos igual aos nossos vilões, fazemos o mesmo só que de maneiras diferentes e tão disfarçadas que é muito difícil ser notado por nós mesmos.
Tal como acontece nos extremos, a independência também ocupa o lugar da dependência porque achamos que o outro (travestido em tantos outros) precisa nos compensar, dar o que nos tirou, nos reconhecer, nos amar incondicionalmente. Há uma vingança oculta porque nossa ignorância ainda é enorme! Como a independência só enxerga a sua parte, nesse lugar pouco ou nada se colhe. Sim,  paradoxalmente tão independentes que nos tornamos dependentes!
Podemos parar aí... pelo resto da vida... Nesse lugar nos isolamos, não perdoamos, não reconciliamos. Porque ainda não reconhecemos nossos severos Mestres continuamos vítimas. É um lugar bem chatinho, de dor, de sacrifícios, injustiças, apertado.

Ou... podemos seguir adiante... rumo à INTERDEPENDÊNCIA!
A interdependência compreende a interconexão entre todas as coisas, sai do seu pequeno e caprichoso casulo para olhar de um lugar acima, amplo... De um todo, onde nada é ao acaso, onde tudo tem um propósito, onde tudo está e esteve sempre certo. 
A interconexão começa a abrir quando cedemos, acolhemos. Para outros pode se dar no perdão mútuo. Fato é, que é só mesmo no momento em que a gratidão começa a florescer no coração - que já é a colheita dos frutos do DESAPEGO real, aquele... das nossas ideias de "como as coisas deveriam ser”,  na compreensão que resultará nas bênçãos e abrirá para as portas do sentimento.

Deste ponto não existe mais independência, existe AUTONOMIA - porque diferente da isolada e suicida INDEPENDÊNCIA -  a AUTONOMIA se insere na INTERDEPENDÊNCIA, na conexão, na rede, na união, no fluxo, e deste lugar se sustenta e gera sustento em intercâmbio mútuo. Fluxo de onde? Rede de onde? Sustento de onde? Do TODO, da Fonte, de "D-Eus".


Liberdade e Responsabilidade - Interdependentes


Há duas palavras interdependentes na conquista da autonomia: liberdade e responsabilidade, estas se interagem num ciclo contínuo para a existência da interdependência.

Quanto mais responsável me torno pelas minhas ações e acontecimentos, bancando (com ou sem arrependimento) aquilo que fiz e faço, do que me aconteça ou tenha acontecido, mais livre estarei para a AUTONOMIA. E frisando que responsabilidade não tem nada a ver com culpa - enquanto a culpa apenas dá ênfase a si mesmo, te distância do TODO, aprisiona e nada resolve -, a responsabilidade assume sua parte, e deixa a parte dos outros para que se responsabilizem. A responsabilidade liberta.

Já a liberdade é tanto consequência da responsabilidade como uma caminhante em paralelo da própria, pois sabemos que quanto maior a liberdade maior a responsabilidade. Mas quando você a banca (a responsabilidade), dela você se apodera, e não é um peso como tanto nos impuseram que fosse. 
Quanto mais liberdade, mais bem estar, mais unidade.


Sem liberdade, sem responsabilidade

O tema aqui é sobre o que vem na verdade bem antes da conquista da autonomia, quando ainda não existe senso de interdependência. Digo do que implica ao medo da liberdade. Sejam relacionamentos, filhos, alunos, servos, cidadães, vamos adquirindo medo do que a liberdade pode causar, e preferimos algemar o outro a nós a lhe dar liberdade, e claro que com isso também estaremos amarrados. Assim como, a exemplo, uma empresa ou um estado que continua a ser responsável por você mas lhe cobra o preço da sua liberdade, como não lhe dar estudo para alcançar seu sustento e evolução, ou como se diz: dá o peixe mas não a independência do saber pescar.

Sem responsabilidade, sem liberdade.
Na vida material igualmente vamos deixando para que alguém - desde que não seja nós -, se responsabilize. Tipo o pai, o marido, o patrão, o médico, o juiz, o estado - heranças do patriarcado. Relacionamentos sem energia criativa. Damos pouco ou fazemos esforço demais, a troca é desigual, desgastante, a energia se esvai.
Essa demonstração até parece ação externa a ser resolvida, mas é resultado, reflexos do emocional da nossa criança ferida, que mantém a visão da dependência como sobrevivência. O problema é sempre de dentro para fora, mas não impede que outras posturas possam ser tomadas, para auxiliar medidas internas de abertura. 

Tem o inverso também, quando a sobrecarga emocional é grande e sonhamos com a liberdade e com autonomia, mas não queremos entender de responsabilidade. 
Se não reconhecemos a interligação, especialmente nossa raiz, pais e ancestrais, nos colocamos um galho independente da árvore, e irresponsáveis do que nos caberia ali como aprendizado e fruto. Há um risco aqui, o de se tornar independente demais, não ser capaz de transmutar a dor e de dissolver as mágoas em prol da interdependência. Como o Universo é sábio as mesmas situações surgirão só que em lugares e com pessoas diferentes, e sabiamente a mestria continuará a atuar, aguardando o dia que despertemos do sonho.

E despertar não significa que para sempre tudo bem, se voltamos para as crenças fixas (apegos), para as culpas, nas tormentas que estagnam a responsabilidade, a liberdade se vai. E se retrocedemos, saímos do fluxo.



A Dança da Vida: Interdependência


Lembrei deste post que havia aqui no blog, e que explica de outra maneira a mesma ideia. Porém descreve esta interdependência em ação. Daquilo que o eu e o outro dependem, do contrair e expandir de qualquer relação, da manutenção do fluxo.
Da mesma forma que acontece na boa colheita da natureza quando a respeitamos sem subjugá-la e sem impor nossa caprichosa vontade, assim acontece com a nossa vida também!


Estar Aberto
Bert Hellinger - Pensamentos sobre Deus, pg 87

Eu me abro a alguém quando eu o honro e ele, por sua vez, fica aberto a mim, que dá sua atenção, me presenteia com prazer, com o melhor que me pode oferecer. E me dá de uma forma que não me sinto obrigado. Pois essa homenagem, que vem de meu âmago e totalmente sem restrições, já é a maior recompensa.
E quando ele percebe como sua generosidade gera frutos em mim, sabe que está sendo homenageado e encontra sua grandeza e plenitude, porque eu tomo dele.
É claro que posso passar a outras pessoas tanto as dádivas gentis que recebi como também os frutos de meu trabalho e experiência. Com isso também cresço e encontro minha grandeza e minha plenitude.
Se me recuso a dar ao outro a homenagem merecida, ele precisa se fechar para mim. Então não posso tomar dele e nem ele pode deixar que eu participe de sua riqueza, mesmo que quisesse. Tanto para mim quanto  para ele são colocados limites dolorosos em relação àquilo que damos a outros e ao que podemos tomar deles. 
É claro que o mesmo também é válido quando outros me negam a homenagem merecida, talvez me diminuam e se coloquem acima de mim. Não posso dar aquilo que tenho a oferecer e nem eles podem tomar de mim aquilo que poderia ajudá-los.
Eu não posso estar aberto a eles e nem eles podem estar abertos para mim. Então estaremos como convidados, sentados à uma mesa coberta de iguarias, sem poder tomar o que é oferecido e presenteado de maneira tão abundante.
Também a natureza e a terra nos presenteiam ricamente quando lhes prestamos homenagem, ao invés de procurarmos subjugá-las e impor-lhes a nossa vontade. Quem lhe presta homenagem descobre seus tesouros ocultos.
Nós também podemos homenagear nossa alma confiando nela. Cuidadosamente ela nos revela seu conhecimento secreto, nos conduz para caminhos antes não imaginados, nos ajudando a realizar nossas metas mais profundas.
As maiores recompensas são possíveis quando nos abrimos para homenagear totalmente nossos pais. 
Estar aberto é humildade e amor. É estar amplo sem limites.








por Milene Siqueira




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